Carta Aos Meus Silêncios
Entre abismos e refúgios, o que se revela no não dito.
Meus caros e inseparáveis silêncios,
Por tanto tempo, vocês foram apenas ausências de palavras, espaços vazios entre o que eu sentia e o que eu conseguia dizer. Hoje, ao escrever-lhes, vejo o quanto vocês são mais do que a simples pausa; vocês são abismos e pontes, esconderijos e espelhos.
Vocês já me salvaram de palavras que poderiam ferir, deixando que o tempo soprasse um pouco de paz em minha garganta seca. Em outras vezes, foram cárceres, sufocando sentimentos que imploravam por voz. E assim seguimos, numa dança entre o refúgio e o peso, onde a escolha de calar pode ser tanto um ato de coragem quanto de medo.
Lembro-me de como vocês me visitaram em momentos de dor, quando a única forma de sobreviver era guardar tudo dentro, como se expor o que sentia fosse rasgar minha própria pele. E houve também os instantes de ternura, em que o silêncio era a única forma de contemplar o que era grande demais para ser dito. Vocês são testemunhas de cada lágrima engolida e de cada sorriso que brilhou no canto dos olhos.
Há silêncios que guardo como segredo, porque nem tudo que vive dentro de mim está pronto para o mundo. Mas há outros, meus silêncios queridos, que carrego como peso, porque o medo de falar me fez pequeno. Em vocês, às vezes me perco; noutras, me encontro.
Quero que saibam que não os renego, mas desejo aprender a habita-los com mais gentileza. Quero que sejam menos uma muralha e mais um jardim onde posso descansar, sem medo de que o não dito me devore.
Meu desejo, silêncios, é que sejamos aliados. Que vocês continuem sendo o espaço onde posso ouvir o que a pressa do mundo tenta calar, mas que, quando preciso, me permitam transformar o não dito em palavras – com calma, sem pressa, mas sem o eterno adiamento.
Porque hoje sei, meus silêncios, que nem tudo precisa ser dito. Mas aquilo que é essencial – seja para curar ou libertar – um dia precisa encontrar sua voz.
Com gratidão e carinho,
De quem, há tanto tempo, vive entre vocês
Eu.
COMPANHIA NO DIVÃ - Bia Melara
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